Sucessão familiar – De geração em geração: como empresas transformam desafios em herança de sucesso

Carolina Barros | Fotos Divulgação

As empresas familiares são verdadeiros pilares da economia brasileira, representando cerca de 90% do total de negócios no país e respondendo por 65% do Produto Interno Bruto (PIB) e 75% dos empregos formais. Mais do que números, essas empresas carregam histórias de dedicação, sacrifício e legados que transcendem gerações. No entanto, o processo de sucessão familiar, que deveria ser um momento de celebração e continuidade, muitas vezes se torna um desafio angustiante e decisivo para a permanência desses empreendimentos. Em um mundo em constante transformação, onde a adaptação e a inovação são cruciais para a sobrevivência, a sucessão familiar exige não apenas planejamento, mas também uma profunda compreensão das dinâmicas emocionais e organizacionais que permeiam o negócio.

A sucessão nas empresas familiares envolve não apenas a transferência de poder, mas também a preservação de valores, cultura e da identidade que fizeram o negócio prosperar. Conflitos familiares, falta de planejamento e a dificuldade de reconhecer as próprias limitações são apenas alguns dos obstáculos que podem comprometer essa transição. Dados do Banco Mundial revelam que apenas 30% das empresas familiares sobrevivem até a terceira geração, e a composição dos conselhos muitas vezes reflete o passado, dificultando a adaptação às novas demandas do mercado.

Em Uberlândia, histórias inspiradoras mostram que a sucessão familiar, quando bem conduzida, pode se transformar em uma oportunidade de crescimento, renovação e fortalecimento de legados.

Erlan: sucessão como missão de preservação do legado

A história da Erlan, fundada em 1983, é marcada por uma trajetória de inovação e crescimento que a consolidou como um elo fundamental na cadeia de insumos alimentares de uma multinacional. Ao longo dos anos, a empresa se destacou não apenas pelos resultados, mas também pela forma como preservou sua credibilidade e valores, elementos essenciais para sua longevidade.

No processo de sucessão, Rosalina Vilela, uma das representantes da família que mantém o comando da Erlan, reforça a importância de enxergar a continuidade do negócio como algo além de um simples ato administrativo. Para ela, a sucessão é, sobretudo, uma missão de preservar o legado de honestidade e credibilidade construído ao longo de décadas. “A sucessão não se resume a um ato administrativo, mas sim à preservação da credibilidade e honestidade que construímos ao longo dos anos. Olhar para o futuro com foco em inovações é essencial”, destaca Rosalina.

Outro ponto fundamental, segundo ela, é o alinhamento de todos os membros da família em relação à visão da empresa. Garantir que o sentimento de pertencimento e o compromisso com os valores da Erlan estejam presentes em cada um dos envolvidos é um desafio que exige maturidade emocional. Rosalina acredita que essa maturidade é essencial para conduzir a transição de forma sábia e respeitosa, assegurando a continuidade do legado familiar de sucesso.

Junco: planejamento e diálogo entre gerações


A Junco, criada em 1991 pelo patriarca da família Junqueira, Sr. Onésimo Domingos da Costa, começou como um pequeno negócio familiar e se expandiu com a força do trabalho em família. Paulo Romes Junqueira é um dos três filhos que tomaram a frente dos negócios ainda na adolescência. Eles optaram por um modelo de sucessão que inclui tanto familiares quanto profissionais de mercado, preparando a próxima geração para liderar. “A autoridade precisa ser conquistada, e essa transição é um processo que exige paciência e diálogo. O sucessor precisa entender que terá que conquistar seu espaço, especialmente no coração da liderança. E não é uma competição. É fazer mudanças com sabedoria”, explica.

Em 2007, a Junco fez um planejamento para 20 anos. Agora, já discute os próximos 20 anos, até 2047, envolvendo ativamente a nova geração. As três filhas adultas de Paulo Romes atuam na empresa. “Ver minhas filhas assumindo a responsabilidade me emociona. É um ciclo de amor e compromisso que visa a perenidade do negócio”, comenta ele, enfatizando a importância de manter o legado familiar.

Filha de Paulo Romes, Débora Junqueira traz uma nova perspectiva sobre a continuidade do legado da Junco. “Para nós, a sucessão é mais do que um ato de passar a liderança, é sobre reconhecer as habilidades de cada membro da família e garantir que a história e o propósito da empresa não se percam”, afirma.

Ela destaca a responsabilidade de honrar a trajetória da família e a importância de manter o foco no resultado final, lembrando que “o CNPJ deve prevalecer sobre o CPF nas decisões”. “Teve muito trabalho, muito esforço, muitas noites sem dormir do meu avô, pai e tios. Sinto que trabalhar na empresa é uma espécie de honra a essa história. Isso é poderoso! Amo saber que posso ensinar isso para as minhas filhas.”

Algar: 95 anos de legado com profissionalismo e estrutura


A Algar é um exemplo de longevidade e adaptação no mercado. Mariana é uma das herdeiras que tem se dedicado a seguir os passos do bisavô, fundador do Grupo Algar, Alexandrino Garcia. “Sempre senti muito orgulho da trajetória da Algar, que completa 95 anos em 2025. Cresci cercada pelos valores que alicerçam nossa cultura: transparência, ética, respeito pelas relações, espírito de servir. São princípios com os quais me identifico profundamente.

Ouvi minha mãe contar as histórias do meu bisavô Alexandrino Garcia (fundador do grupo), vi de perto a dedicação apaixonada do meu tio-avô Dr. Luiz Alberto Garcia – que, aos 90 anos, ainda é uma referência – e acompanhei a entrega e o comprometimento dos meus primos Luiz Alexandre Garcia e Eliane Garcia. São pessoas que admiro e que me inspiraram a seguir esse caminho. Mesmo com os critérios exigentes para atuar no negócio, para mim fazia todo sentido trilhar esse caminho. Não era apenas vontade: era pertencimento. E hoje, sinto que é também uma missão – continuar escrevendo a história da Algar para as próximas gerações.”

Mariana acredita que a sucessão familiar deve ser estruturada e consciente. “Não é um processo de sorte, mas de preparação e responsabilidade. A Academia de Acionistas é uma iniciativa que visa desenvolver as potencialidades de cada membro da família”, explica.

Para ela, a transição é um momento de honra e compromisso. “Recentemente, perdi minha mãe, e isso me fez entender que agora carrego a responsabilidade de continuar a história da Algar para as próximas gerações”, revela, destacando a importância de estar envolvida em redes que promovem a troca entre famílias empresariais.

Klinks: sucessão com foco em inovação e estrutura


A Klinks Representações atua no setor de insumos alimentares e tem um papel crucial na economia de Uberlândia. Fundada em 1983 como elo para uma renomada indústria, hoje é parte de uma multinacional com presença global, com fábricas, centros de pesquisa e escritórios em mais de 70 países.

Flávio Machado destaca a sucessão familiar como pilar essencial para a continuidade e sustentabilidade do negócio. Para ele, preservar o legado empresarial é manter viva a credibilidade e a honestidade que sempre guiaram a empresa – enquanto se busca inovação e expansão.
A motivação de Flávio para seguir os passos da família vai além da herança material; reflete uma profunda conexão com a história e a relevância do negócio. O futuro da Klinks, segundo ele, depende de um planejamento estruturado e da aposta no setor de suplementação, visto como uma grande tendência da alimentação global. Com visão de longo prazo, a missão é transformar o legado em uma empresa ainda mais robusta e inovadora.

Química Estrela: tradição, ética e renovação na prática

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Na Química Estrela, a sucessão familiar é essencial para a continuidade do negócio, que já soma 57 anos de história. Para Lucas e Mateus Ferraz Prado, proprietários, o processo de transição é guiado pela ética, pelo compromisso e pela responsabilidade. Eles reconhecem que apenas 30% das empresas familiares no Brasil chegam à segunda geração e levam essa estatística como motivação para atuar com seriedade.

A decisão de continuar no negócio familiar veio da convivência diária com os valores da empresa, que foram absorvidos desde a infância. Abriram mão de outras oportunidades para construir algo com propósito.

A transição exige sensibilidade e diálogo, respeitando expectativas familiares e promovendo uma sucessão natural. Os irmãos vislumbram uma Química Estrela ainda mais sólida e inovadora, com gestão profissionalizada e cultura alinhada aos princípios que a tornaram reconhecida. Para eles, dar continuidade ao legado é um ato de gratidão e uma aposta em um futuro humano e sustentável.

Oportunidade de renovação
As experiências compartilhadas por esses empresários de Uberlândia revelam que a sucessão familiar, embora desafiadora, também representa uma poderosa oportunidade de renovação. Quando aliada a planejamento estratégico, maturidade emocional e valorização da cultura organizacional, ela se torna o alicerce de negócios longevos e bem-sucedidos. Em um cenário de constantes mudanças, adaptar-se com responsabilidade é o que garante a continuidade e o crescimento das empresas familiares que movimentam a economia brasileira.

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