HUB ECONOMIA: um olho no gato, outro no peixe!

Aqui está um conto de fadas que fala de dois copos meio cheios, meio vazios, vender lenços, lágrimas espertezas e incertezas.

Por Adalberto Deluca

Fotos Bruno Henrique

As comparações entre situações que hora nós aceitamos, outra hora nós julgamos, momentos em que somos combativos e outros quando somos contemplativos, passivos. Esse é miolo do pão que muitas vezes nem tem sabor e nem vale o quanto pesa, apesar de pagarmos preço de ouro se avaliarmos para que serve afinal.

Como não é a farinha e sim o gato faminto e o peixe saboroso o tema que inspira essa crônica da babel econômica, então deixemos a padaria e vamos

logo ao que pode interessar.

Fatos são que, se economia vai bem, criticamos a segurança, se não estamos bem economicamente esquecemos a segurança e quero acusar a economia. Mesmo que muitos de nós passemos a vida ouvindo e finalizamos a jornada sem entender bulhufas ou pantufas de uma vida ouvindo sem escutar, de fato, aonde queriam chegar os sagazes plantonistas que, na verdade, passam o tempo nos amedrontando.

Se estamos em uma situação em que podemos nos beneficiar ignoramos as nossas falhas de caráter e de julgamento. Se estamos em uma situação em que podemos ser prejudicados apontamos para as falhas de julgamento e de caráter dos outros. Ah! Mas quem tem falha de caráter? Nunca vi falar… Exemplos não faltam, mas é preciso tirar as crianças da sala para termos essa conversa (meio antigo isso, talvez “você não está preparado para essa conversa” diria meu conselheiro. Vamos lá, para não virar blábláblá. Se nosso salário aumentou, esquecemos o preço das coisas; os preços estão mais altos do que seu salário alcança? Taca-lhe pau, e vamos criticar os governos de plantão (não esse, nem aquele, todos, conforme a circunstância). Os preços caíram? Esquecemos que já foram altos e começamos a consumir mais.

Se o desemprego aumenta ficamos chocados; se grande parte dos desempregados consegue trabalho, seja trabalhando por conta própria ou um novo emprego, ignoramos os índices que nos assustavam e consideramos que tudo está normal e adeus vendaval!

Notícia noticia de fato?

Esses dias uma notícia nos deu a informação de que, somente em 2022, seiscentos mil brasileiros pediram demissão dos seus trabalhos e isso não tem repercussão, agora se fizeram montar uma estatística do desemprego, começaremos achar que estamos em uma crise ainda maior, a maior dos últimos tempos da última primavera, já teria dito um musicista. Não nos damos conta das consequências que sempre vêm quando temos de deixar de exercer nossas atividades principais e gerar nossas rendas. Assim que as máscaras vão caindo – não literalmente – começamos a perceber que o forno de uma grande indústria siderúrgica parado de seis a oito meses em 2020 gerou desemprego, doenças emocionais e queda na atividade econômica de forma geral. Mais ainda (e ainda mais) quando essa situação afetou o trabalho de cada um ou a renda e por isso ficamos alarmados com as notícias de inflação, queda da atividade econômica etecétera.

De gota em gota se alimenta um peixe?

A muito se ouve a expressão o copo meio cheio ou meio vazio ou, vender lenços enquanto outros choram e tratamos isso como piada ou como falácias, ou como papagaio, repetindo frases feitas. Porém, se olharmos para a história sempre houve alguém com copo meio vazio enquanto outros vendiam lenços e o certo é que se alguém está passando por uma crise certamente um outro alguém estará tendo algum sucesso.

Quantos garotos, que não tinham a chance de um trabalho por baixa escolaridade até meados dos anos 2010, passaram a trabalhar como entregadores de aplicativos chegando com o food da hora às nossas portas, com mais frequência do que o lixão pode aguentar os restos nossos de cada dia? Quantos outros jovens universitários, ou que abandonaram a graduação, ou fizeram em uma dessas faculdades caça-níqueis que proliferaram pelo Brasil e passaram a ter atividade remunerada, trabalhando como motoristas de aplicativos e quantos fomos servidos por esse novo modelo de transporte superando o famigerado e atrasado modelo do táxi? E ficamos tão felizes que vendemos nosso segundo e até terceiro carro (enfeite de garagem, como diria uma jovem senhora de opiniões autênticas!) e passamos a transitar por aí nas madrugadas sem nos preocuparmos com a lei seca! Aí nos bombardearam com a informação de que esses mesmos motoristas estavam sendo explorados, que não tinham direitos trabalhistas etecétera, etecétera. E o que fizemos? Adotamos a crítica à qualidade dos serviços, aos atrasos e outras muitas queixas, sagradas ou sangrentas.

Fato é que, quando um garoto buzina ou aperta campainha para nos trazer a quentinha que compraríamos se tivéssemos de ir até eles – porque faríamos comparações, porque pensaríamos no recurso escasso disponível etecétera etecétera – e então, quando estamos dirigindo nossos carros – armaduras criticamos a velocidade e a forma até certo ponto irresponsável com que esses mesmos antes adoráveis motociclistas trafegam como o bêbado equilibrista, escancarado pela saudosa Elis, mas não em um cabo de aço às alturas e sim sobre o fio da navalha.

Vamos ver se o peixe está no ponto?

Olhando as publicidades disponíveis nas ruas, na web e que tais assistimos disparar os preços de automóveis, que teve como causas principais a escassez de matéria-prima (está ligado naquela usina que parou de produzir aço?) na falta que a China faz quando não fabrica componentes – nem pense nos sites que adoçam o ego – e também porque havia escassas pessoas de copos bem cheios de recursos para comprar o que queriam e a qualquer hora, esse última razão a prova viva da excessiva concentração de rendas e riquezas. E eis que assim chegamos a uma inflação artificializada.

Agora, nos deparamos com ofertas dos mesmos automóveis nas mídias espalhadas por aí e, sem nenhuma surpresa para o cabeça branca, vemos informações de que o setor está em crise, com baixa demanda, com produção em queda e blábláblá. Prestando atenção no gato até que o peixeesteja finalmente no ponto – não misture com dormir no ponto! – vemos lojas tradicionais com suas portas abertas, com aluguéis corrigidos pelo IGPM, que chegou a 32% recentemente (!), anunciarem vendas pelo WhatsApp com frete grátis e então já começo a pensar que o peixe está queimando, porque isso está com cheiro de que teremos alguém desempregado logo ali na frente, certamente um novo transeunte das ruas cheias de profissionais zumbis. Também logo ficaremos indignados com governos, com os mais ricos, os capitalistas etecétera etecétera.

Peixe engoliu o gato

Uma vez que o peixe não estava queimando, mas, sim ficando cada vez mais perto do ponto, temos o lado positivo de tudo isso que é o crescimento avassalador do e-commerce nos últimos anos e isso é comemorado pelo setor de tecnologia, dos investimentos em capitais e que tais. Voltando os olhos mais uma vez para o danado do gato que não nos tirou o peixe podemos dizer que tudo vai como

antes no quartel de Abrantes – outra expressãozinha antiga – que nos faz girar o pescoço a toda hora para o lado e para o outro para termos o melhor peixe assado e um gato faminto, que se quiser que espere pela espinha do peixe.

Falemos então aquela diarista que deixava nossa casa sempre pronta para receber os onvidados à refeição a base de peixe? Ela desapareceu ou ficou muito cara – ou eu que passei ganhar pouco – e então fico procurando a estatística que me diga por onde anda porque os amigos pedem referências e ela está com agenda cheia. E o mercado financeiro também tem seu peixe e seu gato até porque, quem paga a conta sou eu e você claro e então, no começo da semana, eles alegam que tudo depende dos juros, da inflação nos Estados Unidos até que, ao chegar o entardecer na sexta-feira, a próxima eleição é uma incógnita para a economia e viveremos da especulação. Tem até aqueles blogs pseudo-denominados de especialistas e que na verdade vivem de plantar o lucro da próxima semana.

Você certamente percebeu com seu olhar atento que tudo isso se trata de economia. Aquela que já fez um ilustre comandante do tesouro alheio em terras do norte das américas bradar certa vez: “É a economia, imbecil” em uma referência ao caos político do plantonista do poder por lá. E vamos nós discutir esse tema nas mesas castas, nas paróquias sem castidades, nas esquinas da vila e no charmoso clube de golfe. Com a queda percebida do interesse pelo futebol tupiniquim me parece que nossa segunda especialização formada nas calçadas país afora está cada vez mais ao gosto do freguês, aos gatos tudo, aos peixes o aquário.

Se você tem preferência pelo bichano já sabe que, tal qual nossos lustrados (mais uma vez cuidado para não confundir com ilustres) representantes do polvo – aquele cheio de tentáculos – já nos não servem mais peixes, pois eles se multiplicam facilmente dependendo de nosso fervor e ainda cheiram mal ou bem menos mal do que certos paletós que desfilam na obra de arte invadida há décadas. E isso é muita concorrência para quem herdou do gato

apenas a conhecida fidelidade indiferente. Não me queira mal, pois não há como dissociar por aqui, em terras tropicais o politiquês do dinheiro. Esse faz parte da economia e aquele desfruta da nossa economia. Antes que eu esqueça, depois do PIB malfalado, do desemprego que emprega, da inflação que derrete, agora a pouco li sobre os maus pagadores, talvez eu ou você, que somos conhecidos por inadimplentes, pois quem fala disso ou faz isso se tornar o fato que é não tem nenhum problema com o bolso ou a bolsa, mas finge que se preocupa com gente como a gente.

De lágrimas e varais

O olhar faminto do gato me faz prestar tanta atenção nele que esqueço daquele peixe delicioso que estaria a um passo do paraíso do meu paladar. A qualquer momento então, de novo o circo de horrores se repete e alguns enchem o copo de lágrimas, outros secam os lenços para reciclar e revender. Eu tive de usar muito “ou” aqui uma vez que, quando se trata de gato e peixe, ou é ou não é! E você, já empunhou os talheres?

  • Adalberto Deluca – consultor sócio da Know How Consulting, palestrante.

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