A era pós-pandêmica

“A tristeza pela falta de liberdade deve ser substituída pelo reconforto em favor da nossa própria vida”
Por Dra. Clarissa Aires de Oliveira
Fotos Daniel Cavalari | Divulgação
Há pouco mais de um ano, a Organização Mundial da Saúde declarou que o mundo vivia uma pandemia causada pelo novo coronavírus, o Sars-Cov-2. Uma situação que nunca pensávamos que viveríamos novamente e que forçou o mundo a vivenciar uma mudança radical e extremamente rápida no que se considerava normal. Passados cerca de 15 meses, dentre as inúmeras dificuldades sanitárias, econômicas e sociais geradas pela Covid-19, não só a saúde física foi afetada, mas hoje também vivemos uma outra epidemia paralela, que diz respeito à saúde mental das pessoas: houve, visivelmente, uma deterioração da saúde mental da população em geral. Existem muitas frentes da sociedade que foram afetadas. Pesquisadores de várias instituições de pesquisa do país estão envolvidos em estudos que abordam os diferentes impactos da doença nos diversos setores da sociedade.
Uma pesquisa coordenada pela Fiocruz, feita em parceria com outras instituições, mostrou que, durante a pandemia de Covid-19, sintomas de ansiedade e depressão afetam 47,3% dos trabalhadores de serviços essenciais no Brasil e na Espanha. Mais da metade deles, 27,4%, sofre de ansiedade e depressão ao mesmo tempo. Além disso, 44,3% têm abusado de bebidas alcoólicas e 42,9% sofreram mudanças nos hábitos de sono. Esses dados dão uma ideia de que este é um momento de grande adaptação que envolve profissionais de todas as áreas, mas sobretudo na área médica. O atendimento do paciente com um olhar mais integral se torna fundamental daqui pra frente, com o apoio de uma equipe multidisciplinar. O que seria esse olhar integral? O que deve contemplar nesse momento? Para se ter em mente os pontos a serem abordados nessa terapêutica integral, é preciso se lembrar sobre definição de saúde para se agir de maneira pontual em cada frente.
A definição de saúde, segundo a OMS, fala do bom funcionamento do organismo em três diferentes níveis:
– Psicossociais: interação do indivíduo com seu trabalho e outros ambientes que interferem diretamente na sua vivência de bem-estar. Nesse nível já podemos ver a mudança profunda que a pandemia nos trouxe, o quão afetadas foram essas interações, já que várias frentes de trabalho foram totalmente reformuladas através do trabalho home office, para aqueles que podiam. Além disso, crianças e adolescentes também vivenciaram uma situação que as retirou do convívio e ambiente escolar.
– Ambientais: abrangem fatores físicos, químicos e biológicos externos ao indivíduo e os fatores que impactam seus comportamentos, ou seja, a pandemia nos levou a uma situação de vulnerabilidade e risco com todas as suas consequências sanitárias.
– Fisiológicas: corresponde ao bom funcionamento físico, orgânico e bioquímico do organismo, que também foi um ponto extremamente afetado na pandemia, levando a um aumento da incidência de várias doenças crônicas.
Então, hoje, vivemos um grande desequilíbrio dessas três frentes que contemplam uma boa saúde. E é por isso que todas as especialidades médicas, na era pós-pandêmica, precisarão se adaptar para abordar um paciente que precisará de vários níveis de cuidado. Precisaremos oferecer ferramentas que identifiquem, mensurem e modulem o estresse em todas as suas formas, para trazer o sistema nervoso autônomo para um ponto de equilíbrio. E para isso temos várias terapias, como REAC, Nucalm, Ondamed, e também podemos sugerir práticas de meditação. Também podemos trabalhar com suplementação para ajustar o estresse bioquímico. Eu sempre disse que tempos de guerra pedem medidas de guerra. E decretar estado de guerra nesse caso é orientar todas as forças no sentido de nos proteger dessa convergência de fatores que apontam pra o aumento do estresse e, consequentemente, da perda de qualidade de vida e adoecimento.
De olho nesta realidade, comecei a cuidar dos meus pacientes com novos tipos de suplementos ou medicamentos que chamo de doses diárias de nutrição emocional. Também é importante descobrir novos hobbies e prazeres na vida. Aprender algo novo, se motivar, sair da zona de conforto, assumir novas atividades nos momentos livres, atividades lúdicas que sejam nutrientes para a alma. Se quisermos ser agentes ativos no controle dessa pandemia e lutar contra esse inimigo invisível, também precisamos estar mais atentos com o nosso comportamento frente ao coletivo. E, no meio do caos de informações desencontradas que apareceram, sugiro que procurem se informar com pessoas que possam trazer informações seguras, de origem séria, comprovadas e mais equilibradas, pois isto nos transmite uma maior sensação de segurança.
A tristeza pela falta de liberdade deve ser substituída pelo reconforto em favor da nossa própria vida, da vida da nossa família e do coletivo. Precisamos pensar que isto não vai durar para sempre. Assumir e entender que estamos vivendo uma pandemia pode trazer muitas inquietações, mas, acima de tudo, precisamos ter a esperança de que sairemos melhor deste processo de crescimento coletivo. O ser humano é o ser humano e as suas circunstâncias, quando mudam as circunstâncias, muda o ser humano. E, nessa situação pandêmica, cada um reage a seu modo. Mas precisamos gerar esperança e fazer mover, movimentar e trabalhar para que dias melhores aconteçam. E quanto mais rápido nos unirmos como humanidade, mais rápido sairemos dessa situação.

Dra. Clarissa Aires de Oliveira é médica, fundadora da Clínica Conceito Saúde, coordenadora do curso de Pós-Graduação em Medicina Integrativa da Uniube e presidente do Observatório Internacional de Estresse Oxidativo. Instagram @draclarissa @clinicaconceitosaude